Pelas formas de narrar a si mesmo
- Eduardo Martins

- 30 de abr. de 2023
- 2 min de leitura
Já pararam na frente do espelho e tiveram aquela sensação de estranhamento ao olhar para si mesmo? Ou alguma vez tiveram que responder ao convite de falar sobre si? “Quem é você?” “Fale um pouco sobre ti”, tais perguntas e pedidos nos soam um tanto desconcertantes às vezes.
Nesses momentos, surgem diversas coisas em nossa mente que tentam dar conta da pergunta. Podemos começar com algo mais formal, como profissão, idade, área de estudo, ou podemos ir por um caminho mais íntimo, falar dos nossos sonhos, do nosso dia a dia, das coisas que gostamos e desgostamos...

O curioso é que tais questionamentos podem ser tão enigmáticos de se responder para os outros como para nós mesmos. Parece que diante de tal indagação se abrem tantas possibilidades de caminhos, acendem-se histórias, lembranças e imagens que tentam formar uma unidade que possa ser comunicável, compreendida. Embora, de fato, sempre saímos com uma sensação que não era bem aquilo...
Essa tentativa é própria da linguagem, uma busca por gerar um sentido, uma compreensão, algo ao qual podemos nos agarrar. No entanto, tal unidade delineada acaba por ser sempre conflitante, visto que tenta delimitar algo que está em constante movimento. Suas bordas são arbitrárias.
Quantas vezes nos pegamos pensando em coisas que gostaríamos de fazer, de agir, de viver, mas que de alguma forma ou de outra parecem que não são compatíveis, não se articulam com a imagem que temos de nós mesmos. No entanto, mesmo que não apareçam em nosso horizonte de si, esse ímpeto continua lá, de poder agir diferente, de poder ser um outro distinto do que se é agora.
“O correr da vida embrulha tudo”, dizia Guimarães Rosa. Creio que os processos de mudança iniciam-se em nutrir essas forças estranhas que se manifestam em nós e que contrastam com essa ideia de nós mesmos. Observar esse “Eu sou...” em constante movimento.
É abraçar o estranhamento frente ao espelho, para que assim, possamos expandir o olhar a novos horizontes.



